Carta MCC Brasil – Junho 2013 (166ª.)
“Depois de tudo isso,
derramarei o meu espírito sobre todos os viventes.
E, então, todos os filhos e filhas falarão como profetas...!” (Joel 3, 1ab).
“Vós todos podeis profetizar...” (I Cor 14,31).
Amados
irmãos e irmãs, chamados que fomos para sermos e atuarmos como profetas
nestes novos tempos de Igreja, a paz e o amor de Jesus estejam com
todos vocês!
Para
esta nossa Carta de junho, duas propostas nasceram na minha mente e
amadureceram longamente no meu coração. A primeira é uma reflexão sobre a
profecia na vida dos seguidores de Jesus, motivada pela celebração,
neste mês, de três grandes profetas: João Batista, cujo nascimento se
comemora no dia 24 e os Apóstolos Pedro e Paulo no dia 30. A segunda –
como não poderia deixar de ser -, é uma constatação motivada pelas
atuais providenciais circunstâncias históricas, uma nova primavera que
vive a nossa Igreja Católica.
1. Profecia e Profeta: anúncio, denúncia e os profetas de ontem e de hoje.
Não é muito clara a origem do termo “profecia”. Em todo o caso, sua
conotação é a de “oráculo”, anúncio ou, também, de advertência ou
denúncia. O profeta usa ora palavras de carinho e ternura, de promessas e
de acolhida para os que observam os mandamentos e normas divinas e
andam pelos bons caminhos, ora emprega palavras duras de ameaças e
castigos terríveis para os que enveredam pelos desvios e descaminhos
contrários aos projetos divinos. Quanto à história da nossa salvação, é
bastante percorrer alguns dos 18 livros proféticos do Antigo Testamento
para que nos demos conta desse processo, digamos, pedagógico-educativo
do povo eleito. O profeta, aquele que vive intimidade com Deus, é o
encarregado por Ele para anunciar ao povo, ou o perdão e o abraço
divinos, ou os castigos merecidos pelos que se afastam das leis do
Senhor. Isto está em conformidade com o que se lê no Profeta Joel, citado acima. Por
isso, é provável que o nome “profeta”, como é empregado na Bíblia,
signifique aquele que fala como acreditado mensageiro do Altíssimo.
Deve-se observar que nos termos “profecia” ou “profeta” não há nada que
implique previsão de acontecimentos. Pode um profeta predizer, ou não, o
futuro segundo a mensagem que Deus lhe der.
Mas –
poderia alguém perguntar – porque esta introdução? Justamente para
lembrar o último dos profetas do AT, João Batista e os dois primeiros,
Pedro e Paulo, sem falar no profeta dos profetas, Jesus. E, é claro,
para voltar a chamar nossa atenção de discípulos missionários, profetas
que deveríamos ser de nossos tempos.
a) João Batista, o último dos profetas do AT. “Em verdade, eu vos digo, entre todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista”
(Mt 11,11). João foi o profeta corajoso, destemido que, de peito
aberto, usa palavras duras de denúncia e de ameaças de castigos às
“víboras” – fariseus e saduceus: “Víboras
que sois, quem vos ensinou a fugir da ira que está para chegar? Produzi
fruto que mostre vossa conversão” ... O machado já está posto à raiz
das árvores. Toda árvore que não der bom fruto será cortada e jogada ao
fogo” (Mt 3, 7b; 8;10). Mas foi, sobretudo, o profeta do anúncio da conversão, da preparação, da chegada e da presença de Jesus: “Convertei-vos,
pois o Reino de Céus está próximo. “É dele que falou o profeta Isaías:
‘Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai
as veredas para ele’” (cf. Mt 3, 1-17). E vem agora o principal na
vida de João Batista: ao avistar Jesus, num alegre e indizível ímpeto
profético, manifestando a razão de ser de sua missão, exclama:
“Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo. É dele que
eu falei: ‘Depois de min vem um homem que passou à minha frente, porque
antes de mim ele já existia’” (Jo 1,29-30).
Para sua reflexão:
a você, batizado, seguidor de Jesus, membro de comunidades e de
movimentos eclesiais (do Movimento de Cursilhos, por exemplo), pergunto:
até onde vai sua consciência de ser profeta de Jesus? Mais: até onde
chega sua coragem para – como João Batista – denunciar a hipocrisia, o
erro, a maldade e, sobretudo, anunciar que o “Reino já está no meio de
nós?”, isto é, anunciar que Jesus está vivo e presente na nossa cultura,
na nossa sociedade que anda tão distante Dele?
b) Os santos Apóstolos Pedro e Paulo, primeiros profetas do NT. Primícias
da Igreja pensada pelo Mestre e iniciada com a primeira comunidade de
homens e mulheres reunida ao seu redor, são eles também os primeiros
profetas do NT. Firmados, agora, no fato da ressurreição de Jesus,
assumem, corajosos, a missão de sair pelo mundo anunciando a Boa Nova: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda criatura” (Mt 16,15). Eis que Pedro, inflamado pelo Espírito Santo, superando o medo (cf.Jo 20,19) e enfrentando “partas, medos e elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judéia e da Capadócia, do Ponto e da Ásia... (cf At 2,9-11), ao mesmo tempo que anuncia a pessoa de Jesus, denuncia aqueles que mataram o mesmo Jesus: “Deus, em seu desígnio e previsão, determinou que Jesus fosse entregue pelas mãos dos ímpios, e vós o matastes, pregando-o numa cruz”
(At 2,23). E o que dizer do espírito profético do convertido, o judeu
Saulo, depois Paulo? Em inúmeras ocasiões, em incontáveis escritos e
conteúdos de suas cartas, deixa muito claras as corajosas denúncias
contra o mau procedimento de muitos que, pelo seu próprio ministério,
haviam abraçado a fé cristã.
Para sua reflexão:
vivemos uma realidade que a todos nós, na maioria das vezes, nos impede
de sermos os profetas que deveríamos ser e que, se na vida de quase
todos os profetas e nos primórdios da Igreja era comum, nos dias de
hoje, na atual cultura do relativismo e da pressão social alimenta, até,
uma certa vergonha nos cristãos. Trata-se do medo. Medo de anunciar;
mais, medo de denunciar; medo de atitudes e gestos proféticos.... enfim,
medo de se agir como discípulo missionário de Jesus! Você também anda
pressionado por este medo? Esqueceu-se, meu caro profeta, minha querida
profetiza, que foi Ele que disse: “Não tenham medo?” E, então?
2. Uma “nova primavera na Igreja Católica”.
Somos cristãos católicos privilegiados. Tenho certeza de que todos
temos consciência de estar vivendo novos tempos, novos desafios e novas
perspectivas para a Igreja Católica. Fala-se, até, numa nova primavera
da Igreja. Como já o fiz na Carta do mês passado, refiro-me, à eleição
do Bispo de Roma (“o primeiro entre iguais”), Francisco. Seus gestos,
seus testemunhos pessoais estão a nos indicar claramente uma nova
postura para todos os católicos, para toda a Igreja. Não basta dizer que
a Cúria romana deverá ser reformada ou que este é o Papa de que
precisamos, etc. É urgentemente necessário que seu exemplo e testemunho
atinjam a mentalidade e a vida de toda a hierarquia da Igreja, bispos e
sacerdotes, religiosos e religiosas e
de todos os católicos. Do contrário, os exemplos de Francisco, cairão
no vazio e, como diz no título de um maravilhoso e profético artigo, um
dos mais conhecidos teólogos contemporâneos, Hans Küng, companheiro que
foi de magistério do emérito Papa Bento XVI: “Não deixem a Primavera virar Inverno”. Primavera
na Igreja é superar uma “Pastoral de mera conservação e sair para uma
pastoral decididamente missionária” (Cf Doc.370). SAIR é um dos verbos
mais usado pelo Papa Francisco. Igreja, comunidades, movimentos
eclesiais devemos todos SAIR... Por oportuno, aplicando-a, sobretudo, ao
Movimento de Cursilhos, permitam-me repetir uma comparação feita por
Francisco ao afirmar que a Igreja deve sair para a missão: Diante desta alternativa, quero dizer-lhes fracamente que prefiro mil vezes uma Igreja acidentada do que uma Igreja doente.
A doença típica da Igreja fechada é a auto-referência; contemplar-se a
si mesma, estar curvada sobre si mesma como aquela mulher do Evangelho”.
Que
a intercessão de São João Batista e dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo
juntamente com a de Maria, possa fazer com que criemos uma mentalidade
cada vez mais profética e missionaria, uma mentalidade de autênticos
discípulos missionários de Jesus, são os votos mais fraternos de
Pe.José Gilberto BERALDO