Entrevista com o papa Francisco na sua viagem de volta:
Nestes quatro meses de pontificado, o
senhor criou várias comissões. Que tipo de reforma do Vaticano o sr. tem em
mente? O sr. quer suprimir o Banco do Vaticano?
Papa Francisco – Os passos que eu fui dando
nestes quatro meses e meio vão em duas vertentes. O conteúdo do que quero fazer
vem da congregação dos cardeais. Me lembro que os cardeais pediam muitas coisas
para o novo papa, antes do conclave. Lembro-me que tinha muita coisa. Por
exemplo, a comissão de oito cardeais, a importância de ter uma consulta de
alguém de fora, e não uma consulta apenas interna. Isso vai na linha do
amadurecimento da sinonalidade e do primado. Os vários episcopados do mundo vão
se expressando e muitas propostas foram feitas, como a reforma da secretaria
dos sínodos, para que a comissão sinodal tenha característica consultativa,
como o consistório cardinalício com temáticas específicas, como a canonização.
A vertente dos conteúdos vem daí. A segunda é a oportunidade. A formação da
primeira comissão não me custou mais de um mês. Já a parte econômica, eu
pensava em tratar no ano que vem, porque não é a mais importante. Mas a agenda
mudou devido a circunstâncias que vocês conhecem que são domínio público. O
primeiro é o problema do Ior (Banco do Vaticano), como encaminhá-lo, como
reformá-lo, como sanear o que há de ser sanado. E essa foi então a primeira
comissão. Depois tivemos a comissão dos 15 cardeais que se ocupam dos assuntos
econômicos da Santa Sé. E por isso decidimos fazer uma comissão para toda a economia
da Santa Sé, uma única comissão de referência. Se notou que o problema
econômico estava fora da agenda. Mas estas coisas acontecem. Quando estamos no
governo, vamos por um lado, mas se chutam e fazem um golaço por outro lado,
temos que atacar. A vida é assim. Eu não sei como o Ior vai ficar. Alguns acham
melhor que seja um banco, outros que deveria ser um fundo, uma instituição de
ajuda. Eu não sei. Eu confio no trabalho das pessoas que estão trabalhando
sobre isso. O presidente do Ior permanece, o tesoureiro também, enquanto o
diretor e o vice-diretor pediram demissão. Não sei como vai terminar essa
história. E isso é bom. Não somos máquinas. Temos que achar o melhor. Mas o
fato é que, seja o que for, tem que ser feita com transparência e honestidade.
Uma fotografia do sr. deu a volta ao
mundo, quando o sr. desceu as escadas do helicóptero em Roma para embarcar para
o Brasil carregando sua mala preta. Reportagens levantaram hipóteses também
sobre o conteúdo da mala. Porque o sr. saiu carregando a maleta preta e não um
de seus colaboradores? E o sr. poderia dizer o que tinha dentro?
Papa Francisco – Não tinha a chave da bomba
atômica. Eu sempre fiz isso. Quando viajo, levo minhas coisas. E dentro o que
tem? Um barbeador, um breviário (livro de liturgia), uma agenda, tinha um livro
para ler, sobre Santa Terezinha. Sou devoto de Santa Terezinha. Eu sempre levei
eu mesmo minha maleta. É normal. Nós temos que ser normais. É um pouco estranho
isso que você me diz que a foto deu a volta ao mundo. Mas temos de nos habituar
a sermos normais, à normalidade da vida.
Por que o senhor pede tanto para que
rezem pelo senhor ? Não é habitual ouvir de um papa que peça que rezem por ele.
Papa Francisco – Sempre pedi isso. Quando era
padre pedia, mas nem tanto e nem tão frequentemente. Comecei a pedir mais
frequentemente quando passei a ser bispo. Porque eu sinto que se o Senhor não
ajuda nesse trabalho de ajudar aos outros, não se pode realizá-lo. Preciso da
ajuda do Senhor. Eu de verdade me sinto com tantos limites, tantos problemas, e
também pecador. Peço à Nossa Senhora que reze por mim. É um hábito, mas que vem
da necessidade. Eu sinto que devo pedir. Não sei…
Na busca por fazer as mudanças no
Vaticano, o sr. disse que existem muitos santos que trabalham e outros um pouco
menos santos. O sr. enfrenta resistências a essa sua vontade de mudar as coisas
no Vaticano? O sr. vive num ambiente muito austero, de Santa Marta. Os seus
colaboradores também vivem essa austeridade? Isso é algo apenas do sr. ou da
comunidade?
Papa Francisco – As mudanças vêm de duas
vertentes: do que pediram os cardeais e também o que vem da minha
personalidade. Você falou que eu fico na Santa Marta. Eu não poderia viver
sozinho no Palácio, que não é luxuoso. O apartamento pontifício é grande, mas não
é luxuoso. Mas eu não posso viver sozinho. Preciso de gente, falar com gente,
trabalhar com as pessoas. Porque é que quando os meninos da escola jesuíta me
perguntaram se eu estava aqui pela austeridade e pobreza, eu respondi: não,
não. É por motivos psiquiátricos. Psicologicamente, não posso. Cada um deve
levar adiante sua vida, seguir seu modo de vida. Os cardeais que trabalham na
Cúria não vivem como ricos. Têm apartamentos pequenos. São austeros. Os que eu
conheço têm apartamentos pequenos. Cada um tem que viver como o senhor disse
que tem que viver. A austeridade é necessária para todos. Trabalhamos a serviço
da Igreja. É verdade que há sacerdotes e padres santos, gente que prega, que
trabalha tanto, que trabalha e vai aos pobres, se preocupam em garantir que os
pobres comam. Tem santos na Cúria. Também tem alguns que não são muito santos.
E são estes que fazem mais barulho. Faz mais barulho uma árvore que cai do que
uma floresta que nasce. Isso me dói. Porque são alguns que causam escândalos.
Temos o monsenhor que foi para a cadeia (por lavagem de dinheiro). São
escândalos que fazem mal. Uma coisa que nunca disse : a Cúria deveria ter o
nível que tinham os velhos padres, pessoas que trabalham. Os velhos membros da
Cúria. Precisamos deles. Precisamos do perfil do velho da Cúria. Sobre a
resistência, se tem, eu ainda não vi. É verdade que aconteceram muitas coisas.
Mas eu preciso dizer: eu encontrei ajuda, encontrei pessoas leais. Por exemplo,
eu gosto quando alguém me diz: “eu não estou de acordo”. Esse é um verdadeiro
colaborador. Mas quando vejo alguém que diz: “ah, que belo, que belo”, e depois
dizem o contrário por trás, isso não ajuda.
O mundo mudou, os jovens mudaram. Temos
no Brasil muitos jovens, mas o senhor não falou de aborto, sobre a posição do
Vaticano sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil foram aprovadas
leis que ampliam os direitos para estes casamentos, também em relação ao
aborto. Por que o senhor não falou sobre isso?
Papa Francisco – A Igreja já se expressou
perfeitamente sobre isso. Eu não queria voltar sobre isso. Não era necessário,
como também não falei sobre outros assuntos. Eu também não falei sobre o roubo,
sobre a mentira. Para isso, a Igreja tem um doutrina clara. Queria falar de
coisas positivas, que abrem caminho aos jovens. Além disso, os jovens sabem
perfeitamente qual a posição da igreja.
E qual é a do Papa?
Papa Francisco – É a da Igreja, sou filho
da Igreja.
Qual o sentido mais profundo de se
apresentar como o bispo de Roma?
Papa Francisco – Não se deve andar mais adiante
do que o que se fala. O papa é bispo de Roma e por isso é papa, que é sucessor
de Pedro. Pensar que isso quer dizer que é o primeiro, não é o caso. Não é esse
o sentido. O primeiro sentido do papa é ser o bispo de Roma.
O sr. teve sua primeira experiência de
massas no Rio. Como o sr. se sente como papa? É muito trabalho ?
Papa Francisco – Ser o bispo é lindo. O problema
é quando um pessoa busca ter esse trabalho. Assim não é tão belo. Mas quando um
senhor chama para ser bispo, isso é belo. Tem sempre o perigo e pecado de
pensar com superioridade, como ser um príncipe. Mas o trabalho é belo. Ajudar o
irmão a ir adiante. Têm o filtro da estrada. O bispo tem que indicar o caminho.
Eu gosto de ser bispo. Em Buenos Aires, eu era tão feliz. Como padre eu era
feliz. Como bispo, eu era feliz e isso me faz bem.
E como papa?
Papa Francisco – Se você faz o que o Senhor quer,
é feliz. Isso é meu sentimento.
Vimos o sr. cheio de energia e, agora,
enquanto o avião se mexe muito, vemos agora com muita tranquilidade de pé.
Fala-se muito das próximas viagens. O sr. já tem um calendário?
Papa Francisco – Definido, definido não há nada.
Mas posso dizer algumas coisas que estamos pensando. No dia 22 de setembro,
Cagliari. Depois, em 4 de outubro, para Assis. Tenho em mente dentro da Itália
ir ver minha família. Pegar um avião pela manhã e voltar com outro à noite.
Meus familiares, pobres, me ligam. Temos una boa relação com eles. Fora da
Itália o patriarca Bartolomeu I quer fazer um encontro para comemorar os 50 anos
do encontro Atenágoras e Paulo VI em Jerusalém. O governo israelense nos deu um
convite especial. O governo da Autoridade Palestina acredito que fez o mesmo.
Isso está sendo pensado. Na América Latina, acredito que há possibilidades de
voltar, porque o papa latino-americano, que acaba de fazer sua primeira viagem
à América Latina….Adeus! Devemos esperar um pouco. Acredito que se possa ir à
Ásia, mas está tudo no ar. Tive convites para ir ao Sri Lanka e Filipinas. Para
a Ásia precisamos ir. Bento XVI não teve tempo.
E para a Argentina?
Papa Francisco – Isso pode esperar um pouco. As
outras viagens têm prioridade.
No encontro com os argentinos, o sr.
disse que se sentia enjaulado. Por que?
Papa Francisco – Vocês sabem que eu tenho vontade
de passear pelas ruas de Roma? Adoro andar pelas ruas. E por isso me sinto um
pouco enjaulado. Mas tenho que dizer que a Gendarmeria vaticana é boa. Agora me
deixam fazer algumas coisas mais. Mas seu dever é garantir minha segurança.
Enjaulado nesse sentido, de que gostaria de estar nas ruas. Mas entendo que não
é possível. Em Buenos Aires, eu era um sacerdote das ruas.
A Igreja no Brasil está perdendo fiéis. A
Renovação Carismática é uma possibilidade para evitar que eles sigam para as
igrejas pentecostais?
Papa Francisco – É verdade, as estatísticas
mostram. Falamos sobre isso ontem com os bispos brasileiros. E isso é um
problema que incomoda os bispos brasileiros. Eu vou dizer uma coisa: nos anos
1970, início dos 1980, eu não podia nem vê-los. Uma vez, falando sobre eles,
disse a seguinte frase: eles confundem uma celebração musical com uma escola de
samba. Eu me arrependi. Vi que os movimentos bem assessorados trilharam um bom
caminho. Agora, vejo que esse movimento faz muito bem à Igreja em geral. Em
Buenos Aires, eu fazia uma missa com eles uma vez por ano, na catedral. Vi o
bem que eles faziam. Neste momento da Igreja, creio que os movimentos são
necessários. Esses movimentos são uma graça para a Igreja. A Renovação
Carismática não serve apenas para evitar que alguns sigam os pentecostais. Eles
são importantes para a própria Igreja, a Igreja que se renova.
O senhor disse que está cansado. Há algum
tratamento especial neste voo?
Papa Francisco – Sim, estou cansado. Não há
nenhum tratamento especial neste voo. Na frente, tem uma bela poltrona. Escrevi
para dizer que não queria tratamento especial.
A Igreja sem a mulher perde a
fecundidade? Quais as medidas concretas?
Papa Francisco – Uma Igreja sem as mulheres é
como o colégio apostólico sem Maria. O papal da mulher na igreja não é só
maternidade, a mãe da família. É muito mais forte. A mulher ajuda a Igreja a
crescer. E pensar que a Nossa Senhora é mais importante do que os apóstolos! A
Igreja é feminina, esposa, mãe. O papel da mulher na Igreja não deve ser só o
de mãe e com um trabalho limitado. Não, tem outra coisa. O papa Paulo VI
escreveu uma coisa belíssima sobre as mulheres. Creio que se deva ir adiante
esse papel. Não se pode entender uma Igreja sem uma mulher ativa. Um exemplo
histórico: para mim, as mulheres paraguaias são as mais gloriosas da América
Latina. Sobraram, depois da guerra (1864-1870), oito mulheres para cada homem.
E essas mulheres fizeram uma escolha um pouco difícil. A escolha de ter filhos
para salvar a pátria, a cultura, a fé, a língua. Na Igreja, se deve pensar nas
mulheres sob essa perspectiva. Escolhas de risco, mas como mulher. Acredito
que, até agora, não fizemos uma profunda teologia sobre a mulher. Somente um
pouco aqui, um pouco lá. Tem a que faz a leitura, a presidente da Cáritas, mas
há mais o que fazer. É necessário fazer uma profunda teologia da mulher. Isso é
o que eu penso.
O que sr. pensa sobre a ordenação das
mulheres?
Papa Francisco – Sobre a ordenação, a Igreja já
falou e disse que não. João Paulo II disse com uma formulação definitiva. Essa
porta está fechada. Nossa senhora, Maria, é mais importante que os apóstolos. A
mulher na Igreja é mais importante que os bispos e os padres. Acredito que
falte uma especificação teológica.
Queremos saber qual a sua relação de
trabalho com Bento XVI, não a amistosa, a de colaboração. Não houve antes uma
circunstância assim. Os contatos são frequentes?
Papa Francisco – A última vez que houve dois ou
três papas, eles não se falavam. Estavam brigando entre si, para ver quem era o
verdadeiro. Eu fiquei muito feliz quando se tornou papa. Também, quando
renunciou, foi, pra mim, um exemplo muito grande. É um homem de Deus, de reza.
Hoje, ele mora no Vaticano. Alguns me perguntam: como dois papas podem viver no
Vaticano? Eu achei uma frase para explicar isso. É como ter um avô em casa. Um
avô sábio. Na família, um avô é amado, admirado. Ele é um homem com prudência.
Eu o convidei para vir comigo em algumas ocasiões. Ele prefere ficar reservado.
Se eu tenho alguma dificuldade, não entendo alguma coisa, posso ir até ele.
Sobre o problema grave do Vatileaks [vazamento de documentos secretos], ele me
disse tudo com simplicidade. Tem uma coisa que não sei se vocês sabem: em 8 de
fevereiro, no discurso, ele falou: “Entre vocês está o próximo papa. Eu prometo
obediência”. Isso é grande.
Nesta viagem, o sr. falou de
misericórdia. Sobre o acesso aos sacramentos dos divorciados, existe a
possibilidade de mudar alguma coisa na disciplina da Igreja?
Papa Francisco – Essa é uma pergunta que sempre
se faz. A misericórdia é maior do que o exemplo que você deu. Essa mudança de
época e também tantos problemas na Igreja, como alguns testemunhos de alguns
padres, problemas de corrupção, do clericalismo… A Igreja é mãe. Ela cura os
feridos. Ela não se cansa de perdoar. Os divorciados podem fazer a comunhão.
Não podem quando estão na segunda união. Esse problema deve ser estudado pela
pastoral matrimonial. Há 15 dias, esteve comigo o secretário do sínodo dos
bispos, para discutir o tema do próximo sínodo. E posso dizer que estamos a
caminho de uma pastoral matrimonial mais profunda. O cardeal Guarantino disse
ao meu antecessor que a metade dos matrimônios é nula. Porque as pessoas se
casam sem maturidade ou porque socialmente devem se casar. Isso também entra na
Pastoral do Matrimônio. A questão da anulação do casamento deve ser revisada.
Também é preciso analisar os problemas judiciais de anular um matrimônio.
Porque os…eclesiásticos não bastam para isso. É complexo o problema da anulação
do matrimônio.
Como Papa, o senhor ainda pensa que é um
jesuíta?
Papa Francisco – É uma pergunta teológica. Os
jesuítas fazem votos de obedecer ao papa. Mas se o papa se torna um jesuíta,
talvez devem fazer votos gerais dos jesuítas. Eu me sinto jesuíta na minha
espiritualidade, a que tenho no coração. Não mudei de espiritualidade. Sou
Francisco franciscano. Me sinto jesuíta e penso como jesuíta.
Em quatro meses de pontificado, pode nos
fazer um pequeno balanço e dizer o que foi o pior e o melhor de ser papa? O que
mais o surpreendeu neste período?
Papa Francisco – Não sei como responder isso, de
verdade. Coisas ruins, ruins, não aconteceram. Coisas belas, sim. Por exemplo,
o encontro com os bispos italianos, que foi tão bonito. Como Bispo da capital da
Itália, me senti em casa com eles. Uma coisa dolorosa foi a visita a Lampedusa,
me fez chorar. Me fez bem. Quando chegam estes barcos (com imigrantes), e que
os deixam a algumas milhas de distância da costa e eles têm que chegar (à
costa) sozinhos, isso me dói porque penso que estas pessoas são vítimas do
sistema socioeconômico mundial. Mas a coisa pior é um ciática, é verdade, tive
isso no primeiro mês. É verdade! Para uma entrevista, tive que me acomodar numa
poltrona e isso me fez mal, doía muito, não desejo isso a ninguém. O encontro
com os seminaristas religiosos foi belíssimo. Também o encontro com os alunos
do colégio jesuíta foi belíssimo. As pessoas…conheci tantas pessoas boas no
Vaticano. Isso é verdade, eu faço justiça. Tantas pessoas boas, mas boas, boas,
boas.
O senhor se assustou quando viu o informe
sobre o Vatileaks?
Papa Francisco – Não. Vou contar uma anedota
sobre o informe do Vatileaks. Quando fui ver o papa Bento, ele disse: aqui está
uma caixa com tudo o que disseram as testemunhas. Havia ainda um envelope com o
resumo. E ele sabia tudo de memória. Mas não, não me assustei. São problemas
grandes, mas não me assustei.
O sr. tem a esperança de que esta viagem
ao Brasil contribua para trazer de volta os fiéis?
Papa Francisco – Uma viagem do papa sempre faz
bem. E creio que a viagem ao Brasil fará bem, não apenas a presença do papa.
Esta Jornada da Juventude, eles (os brasileiros) se mobilizaram e vão ajudar
muito a Igreja. Tantos fiéis que foram se sentem felizes (por terem ido). Acho
que vai ser positivo não só pela viagem, mas pela Jornada, que foi um evento
maravilhoso.
Os argentinos se perguntam: o sr. não
sente falta de estar em Buenos Aires, pegar um ônibus?
Papa Francisco – Buenos Aires, sim, sinto falta.
Mas é uma saudade serena.
Hoje os ortodoxos festejam mil anos do
cristianismo. Seu comentário?
Papa Francisco – As igrejas ortodoxas conservaram
a liturgia tão bem, no sentido da adoração. Eles louvam Deus, adoram Deus,
cantam Deus. O tempo não conta. O centro é Deus e isso é uma riqueza. Luz é
oriente. E o ocidente, luxos. O consumismo nos faz tão mal. Quando se lê
Dostoievski, que acho que todos nós devemos ler, precisamos deste ar fresco do
Oriente, desta luz do Oriente.
O que o senhor pretende fazer em relação
ao monsenhor Ricca (acusado de ter amantes) e como o sr. pretende enfrentar
toda esta questão do lobby gay?
Papa Francisco – Sobre monsenhor Ricca, fiz o que
o direito canônico manda fazer, que é a investigação prévia. E nesta
investigação, não tem nada do que o acusam. Não achamos nada. É a minha
resposta. Mas eu gostaria de dizer outra coisa sobre isso. Vejo que muitas
vezes na Igreja se busca os pecados de juventude, por exemplo. Abuso de menores
é diferente. Mas, se uma pessoa, seja laica ou padre ou freira, pecou e esconde,
o Senhor perdoa. Quando o Senhor perdoa, o Senhor esquece. E isso é importante
para a nossa vida. Quando vamos confessar e nós dizemos que pecamos, o Senhor
esquece e nós não temos o direito de não esquecer. Isso é um perigo. O que é
importante é uma teologia do pecado. Tantas vezes penso em São Pedro, que
cometeu tantos pecados e venerava Cristo. E este pecador foi transformado em
papa. Neste caso, nós tivemos uma rápida investigação e não encontramos nada.
Vocês vêm muita coisa escrita sobre o lobby gay.
Eu ainda não vi ninguém no Vaticano com uma carteira de identidade do Vaticano
dizendo que é gay. Dizem que há alguns. Acho que quando alguém se vê com uma
pessoa assim devemos distinguir entre o fato de que uma pessoa é gay e fazer um
lobby gay, porque todos os lobbies não são bons. Isso é o que é ruim. Se uma
pessoa é gay e procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, pra
julgá-la ? O catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem. Diz que eles
não devem ser discriminados por causa disso, mas devem ser integrados na
sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não! Devemos ser como irmãos. O
problema é fazer lobby, o lobby dos avaros, o lobby dos políticos, o lobby dos
mações, tantos lobbies. Esse é o pior problema.
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